A fé dos encarnados
Os adeptos do Benfica são os únicos no mundo com direito a
cor própria – encarnados.
Marcão, mulato flamenguista casado com uma loura chamada
Teresa, berra que nem diabo encarnado: "S. Judas Tadeu nos valha! Viva a
Nação rubro-negra!" Suado em barda, salpicado do espicho da baba de
cerveja do amigo Marcão, sinto estrondosa euforia ao assistir de olho vivo a um
Flamengo-Fluminense na arquibancada do Maracanã. Melhor emoção só mesmo o
Glorioso Benfica em heróica cavalgada na Luz! Em pleno Fla-Flu, dá-me para
gritar: "Viva a Nação encarnada!" Marcão mira de soslaio - "quem
é que encarnou quem?" No Brasil, ‘encarnado' nunca é ‘da cor de carne', só
tem um significado: divindade que assumiu a natureza humana. Marcão fica logo
ali a saber que os adeptos do Benfica são os únicos no Mundo com direito a cor
própria - encarnados.
Já passaram umas décadas. Marcão ainda hoje me trata por
‘encarnado'. Quem cultiva memórias sabe que a culpa da encarnação é do regime
salazarista, medroso do ‘vermelho' em tempos de URSS, ajudado por jornalistas
manhosos que ‘inventaram' o encarnado como cor simbólica do clube da Luz.
Em troca, Marcão explicou que o patrono do Flamengo do Rio
de Janeiro é S. Judas Tadeu, padroeiro mundial das causas desesperadas ou mesmo
impossíveis. Tantas vezes o Flamengo fez o impossível que Marcão repete à
exaustão: "Eu tento ser humilde, mas meu time não deixa!"
As origens laicas e republicanas do Benfica nunca redundaram
em assunção de santo padroeiro, apesar da capelinha que a srª Prieto conseguiu
implantar no estádio. Esta época, o Flamengo corre risco de descer à série B do
Brasileirão e avizinham-se eleições no clube carioca. No último domingo, a
presidente da Nação rubro-negra, Patrícia Amorim, com séquito de torcedores
ilustres, botou reza com pedido na igreja de S. Judas Tadeu, no bairro do Cosme
Velho. O candidato adversário, Maurício Rodrigues, fez o mesmo.
O meu amigo Zé dos Pneus, benfiquista crédulo, acha que
Vieira e Rangel deviam juntar apaniguados em reza forte na Basílica dos
Mártires, na Rua Garrett, única igreja lisboeta onde se venera a imagem de S.
Judas Tadeu. Com fé de encarnado, o Zé acredita que "só o Tadeu para nos
fazer ganhar 3 campeonatos e uma taça europeia em 4 anos..."
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